Acontece que só agora os educadores estão tomando consciência de que a educação é um processo de comunicação. (...) As faculdades de comunicação podem vir a ser no futuro as verdadeiras escolas de “formação do professor”, se é que a profissão de professor vai sobreviver às mutações pedagógicas que estão em vias de ocorrer, pelo menos nos países de civilização pós-industrial. (Lauro de Oliveira Lima)Walcyr Carrasco – escritor de sucesso, articulista de renome, autor de peças teatrais e de novelas, em artigo publicado na revista Época (14.11.2014) e replicado no blog ABMESeduca (leia aqui) – condena a universidade brasileira, chamando-a de burra. E, de forma ferina, destaca: o sistema universitário é rançoso, a universidade não valoriza e nem aproveita os bons profissionais do mercado para compartilhar suas experiências, está completamente distante do mercado de trabalho, os professores são teóricos demais e fazem parte de um “nicho” protegido pelo mais arraigado corporativismo. O mais desconcertante de todas estas afirmações, é que Carrasco tem razão. Tal fato nos obriga a pensar e refletir sobre as suas críticas que fazem parte do nosso dia a dia, embora, a nosso ver, representem pequena amostra do que de fato acontece. Concordamos que a universidade está fora da realidade atual e com uma visão estereotipada e entristecida dos acontecimentos. No entanto, a universidade, que é bimilenar, foi criada para liderar o desenvolvimento e buscar o sucesso das nações. Com estruturas organizacionais pesadas, ficou fora do seu tempo e das demandas empresariais e científicas sem possibilidade de acompanhar as radicais transformações que se sucedem em todas as áreas do conhecimento. Ao longo do tempo, a universidade vem valorizando excessivamente a docência com base nos títulos de mestre e doutor em detrimento do aproveitamento de profissionais que se destacam no exercício efetivo de suas atividades. A questão da formalidade legal está explicada magistralmente pelo consultor jurídico da ABMES, Gustavo Fagundes, que em sua coluna semanal destaca que a legislação educacional brasileira não valoriza, na mesma medida, a experiência profissional dos professores. O sistema avaliativo do Ministério da Educação penaliza com redução de vagas e suspensão de cursos a instituição, cujo corpo docente não tenha a porcentagem de docentes com títulos de mestre e de doutor exigida nas normas legais. A universidade em todos os países está em crise – o que temos afirmado inúmeras vezes em nossos artigos – porque o conhecimento, que não decorre apenas do que é ensinado nas salas de aula, está em toda a parte, em várias fontes de informação, distribui-se por diversos provedores e é intercambiado pelas diversas redes comunicacionais. Aprende-se de várias formas, assistindo-se a uma boa entrevista de televisão ou filme, participando de uma boa palestra ou vivenciando uma experiência de trabalho ou até batendo papo com amigos nas mesas de bar. Isto sem falar nas revolucionárias tecnologias de comunicação – que estão transformando o aprendizado – e da internet que está obrigando os jornais, revistas, outras mídias e até a televisão a mudarem seus modelos para não morrerem. O mesmo poderá acontecer com a universidade. Os cursos de maior procura no meu tempo de estudante eram a medicina, o direito e a engenharia. Todos almejavam trabalhar trinta anos nessas profissões de destaque e/ou na mesma empresa e se aposentar no fim da vida. Hoje a demanda está em todas as áreas e o jovem sabe que vai passar por diversas ocupações e vai precisar reaprender continuamente. O ciclo profissional que começava com as ferramentas, depois com as máquinas, chegando aos computadores, vai conviver com a tecnologia em áreas específicas e com as estratégias aplicadas ao domínio da inteligência nas áreas mais procuradas para atuação profissional.Nos próximos anos o professor que não souber utilizar a tecnologia para personalizar e diferenciar a aprendizagem dos seus alunos será “peça de museu”. As pesquisas mostram que os estudantes querem mais autonomia, desejam aprender com base na sua inteligência emocional e que precisam estar conectados com as redes, como forma de absorver as práticas do mundo real. O jovem quer ser protagonista e produtor do seu próprio conhecimento e não assistente passivo de aulas desinteressantes. E nesta perspectiva, muda o papel do professor como construtor do conhecimento por meio da utilização das múltiplas plataformas de comunicação e da mediação e interação com as fontes de informação e com os estudantes. Os edifícios escolares, além de se transformarem em centros de aprendizagem e não mais permanecerem como locais onde toda a aprendizagem acontece, será também menores. Os horários dos professores e dos alunos irão mudar para permitir que menos pessoas estejam na escola de uma só vez, os caminhos serão abertos a um ensino mais experimental, vivenciado fora do ambiente escolar. A educação vai se tornar mais individualizada, abandonado significativamente a estrutura dos níveis de ensino tal como os conhecemos hoje. Os alunos deverão ser agrupados por temas de interesses específicos, seguindo cada um uma determinada aprendizagem especializada. As normas curriculares atuais que estabelecem enormes bloqueios ao ensino deverão se orientar pela diferenciação da aprendizagem como modelo da educação do futuro. As escolas do ensino básico deverão ser fornecedoras de conteúdos fundamentais e as de nível superior deverão se destacar pela oferta de aprendizagem especializada. Assisti há uns anos uma palestra de Mauricio de Souza, um dos mais famosos cartunistas brasileiros e criador da “Turma da Mônica, para mais de quinhentos universitários da área de design, games e moda. Como resposta a uma pergunta da plateia – “Qual é a melhor área profissional na sua empresa?” – todos esperavam que ele fosse dizer: “desenho”. Mas ouviram estupefatos: “roteirista, pois não há esse tipo de profissional em número suficiente para atender à demanda das diversas plataformas de comunicação no Brasil.” Enquanto nos EUA há cursos especializados para os diversos tipos de redação – cinema, TV, rádio, teatro, revista, internet e outros – no Brasil tais cursos são pouco oferecidos e os raros profissionais existentes são generosamente bem pagos. Os de maior prestígio e famosos, como é o caso de Walcyr Carrasco, recebem verdadeiras fortunas mensais. Graças ao talento, ao trabalho e a grande experiência de Carrasco, considero totalmente justificável e legítimo o seu desejo de colaborar com a universidade brasileira numa área em que ele, mesmo sem o título de doutor, domina magistralmente. Sua revolta também se justifica pelo fato de não sentir por parte da universidade nenhuma sensibilidade e interesse em conhecer o seu trabalho bem como o seu conhecimento na área que poderia ser transmitido aos alunos. Ele não disse isso explicitamente no seu artigo; trata-se de uma dedução nossa ao considerar a sua revoltada mensagem. Com a mudança dos papeis do processo de ensino-aprendizagem, o sistema educacional – que adota cada vez mais a imagem como mensagem – vai precisar de roteiristas especializados para trabalhar a transmissão do conhecimento. Quando Carrasco chama a atenção dos que militam na área da Educação para a obrigatoriedade do domínio da Comunicação, não está dizendo nenhuma novidade. O saudoso Professor Lauro de Oliveira Lima, na década de 1980, já afirmara não só que a educação é acima de tudo um processo de comunicação como também que as faculdades de comunicação teriam um importante papel a desempenhar nessa direção. Mas a reflexão é mais ampla do que parece. O professor, que contava apenas com o quadro negro, tem hoje recursos ilimitados para transmitir conteúdos, dados e qualquer tipo de informação de texto, de som ou de imagem. Na era digital tudo finaliza na tela em que vídeos, números, símbolos, gravações e infográficos apresentam a nova mensagem do conhecimento. Já não é mais somente a palavra e sim todo o “arsenal” midiático da comunicação que conduz ao aprendizado. É um campo novo de atuação que precisa ser planejado, roteirizado e executado. Não tenham dúvidas de que a educação é o campo mais promissor da Comunicação. Quem viver verá.